domingo, 12 de abril de 2009

bravo!

tenho uma superstição quase impublicável. em verdade, trata-se de uma superstição do fernando, que acabei por incorporar. só posso entrar num avião em posse das publicações mais recentes de duas revistas: a bravo! e a mundo estranho. eu sei que é ridículo, mas superstição nunca combinou com racionalidade e, neste caso, pelo menos, além de garantir a chegada em segurança aos meus destinos, eu chego sempre um 'cadin' mais inteligente também (bem melhor do que se a superstição envolvesse as publicações mais recentes de revistas como a caras e a contigo! - duas que só leio em salão de beleza, enquanto faço as unhas, o que, graças a esta minha vida de "executiva", eu faço cada vez com menos freqüência).
desta vez, queridos, deliciei-me, na ida, com uma entrevista a ferreira gullar - "o último grande poeta brasileiro", como o descreveu meu vinícius em 1976. em seis páginas que definitivamente merecem ser lidas (e que, portanto, eu não poderia deixar de indicar a vocês), ferreira gullar brinda o leitor com a lucidez que lhe é característica. vejam alguns trechinhos, que foram por mim selecionados, ou corram para a banca mais próxima, munidos de 14 reais, e peçam pela edição de março da revista bravo! (a edição de abril ainda não estava disponível na laselva do pinto martins dia 4):
... no fundo, a vida não passa de uma constante tensão entre acaso e necessidade.
nada escapa desse binômio?
nada. o que faz o homem sobre a terra? luta para neutralizar o acaso. eis a principal necessidade humana: driblar o imprevisível, a bala perdida. concebemos Deus justamente porque buscamos nos proteger da bala perdida. Deus é a providência que elimina o acaso. é o antiacaso.
você não crê que Ele exista?
gostaria de acreditar, mas não acredito. uma pena... poucas crenças podem ser mais reconfortantes do que a fé em Deus. Ele enche de sentido as nossas vidas sem sentido. "eu não sou cachorro, não!", cantava o waldick soriano, lembra? uma frase sugestiva, já que os homens realmente não se vêem como cachorros. os homens anseiam uma condição sublime. não à toa, inventaram Deus: para que Deus os criasse. Se você pensar direito, todas as coisas abstratas ou concretas que a humanidade constrói têm a intenção de dar significado à vida - e , não raro, um significado especial. nós, que frequentemente praticamos atos injustos, inventamos a justiça. por quê? porque desejamos ser melhores do que somos e tornar menos insolúvel o mistério de viver. a arte surge pelo mesmo motivo.
...
a falta de controle sobre o ato de escrever o angustia?
não, em absoluto. a experiência de criar um poema é maravilhosa. mas, como não depende inteiramente de mim, sei que corro o risco de nunca mais vivenciá-la. se parar de fazer poesia, vou lamentar - só que não a ponto de disparar um tiro na cabeça. nenhum poema, de nunhum poeta, me parece imprescindível. dante alighieri poderia não ter escrito 'a divina comédia'. ou poderia tê-la escrito de outro jeito. novamente: tudo se subordina à lei do acaso e da necessidade.
um poema deve sempre emocionar?
sim, deve emocionar primeiro o poeta e depois o leitor.
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não creio mais em luta de classes. já aprendi que o capitalismo é como a natureza: invencível.
e a crise econômica que o mundo enfrenta atualmente? não põe o capitalismo em xeque?
sem dúvida atravessamos um momento delicadíssimo. mesmo assim, estou convicto de que o capitalismo resistirá. trata-se apenas de mais uma crise num sistema que vive de crises. repito: o capitalismo vai imperar porque segue a lógica da natureza. é brutal, é amoral. não demonstra piedade por nada nem por ninguém. em compensação, nos oferece uma série de benefícios. o capitalismo, à semelhança da natureza, se desenvolve espontanemente. não precisa que meia dúzia de burocratas dite o rumo das coisas, como acontecia nos regimes socialistas. em qualquer canto, há um cara inventando uma empresinha. de repente, no meio deles, aparece um bill gates. são multidões em busca de dinheiro! impossível deter uma engrenagem tão eficiente. podemos, no máximo, brigar para que as desigualdades geradas pelo capitalismo diminuam. aliás, convém que briguemos. não devemos abdicar de um mundo mais justo, ainda que capitalista.
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em setembro de 2010, você completa 80 anos. sente-se realizado?
olha, a vida é uma cesta em que, quanto mais se põe, mais se deseja colocar. estamos sempre partindo do zero. hoje pinto um quadro ou termino de ler um livro. fico satisfeito. mas, amanhã, me pergunto: e agora?
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deixo vocês com estas reflexões, queridos. esta será uma semana cheia em termos de trabalho. duas semanas em uma só, considerando que não trabalhei na passada, em razão da viagem e do feriado da semana santa. de qualquer forma, prometo tentar voltar aqui para contar como foi são paulo. fiquem em paz e não comam o chocolate acumulado da páscoa todo de uma vez.

3 comentários:

  1. Como dizia o nosso grande poeta “A função do poeta não é explicar-se. A função do poeta é expressar-se.(Mário Quintana)”. Será...Eu teria vocação e talento para ser poeta.

    Um apaixonado De a3 + caso

    Sou um poeta por acaso,
    Onde por acaso meu coração ficou querendo o teu.
    Por acaso deixaste sem palavras,
    No momento por acaso que te conheci.
    Deveras saber que ao acaso tu és meu fado
    E por acaso sinto em minha alma a desventura.
    Sinto, que ao acaso este amor que nunca sentirás
    o desejo que por acaso sinto por ti.

    Vai... minha amada segue por acaso teu destino
    Reverencia teu fascínio por acaso em meu coração
    Branda as flechas que por acaso dilacera meu âmago
    Deste amor que ao acaso marcaras em mim
    Vou viver sempre ao acaso
    Até que um dia que por acaso lembrar
    Que mataste e enviaste ao acaso
    Este homem que por acaso te amou.
    Mário Chaves

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  2. Oi Can

    Passei uns dias sem vir ler tuas postagens. Adorei, as usual!
    Devo uma visita a SP. Minhas duas crias (metade paulistanas, metade cearenses)estão pedindo pra visitar locais novos... E tenho q visitar minha mãe e irmãos, que moram lá. Vamos ver se vc me inspira!!
    Bjk , querida

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